Saída de grãos pelo norte cresce, mas não vence aumento de demanda

Mesmo com novos portos e recordes sucessivos de embarque na região mais ao norte do país, o Brasil pode levar até 20 anos para atender à demanda por terminais de exportação, afirma o consultor Luiz Antonio Fayet. Em 2014, o deficit de capacidade de embarque foi de 64 milhões de toneladas: 800 navios graneleiros carregados, o equivalente ao volume de soja que o Brasil já mandou para fora de janeiro a agosto deste ano. A estrutura cresceu desde então, mas zerar o gargalo passado já não é suficiente. A demanda por grãos cresce de 3 milhões a 5 milhões por ano, quantidade que precisa ser incluída nas projeções. Nos cálculos da Embrapa, se forem concluídas até 2025 as oito obras prioritárias para otimizar a saída de grãos, haverá um deficit de capacidade de embarque de cerca de 15 milhões de toneladas na região norte, que inclui os portos de Itacoatiara/Manaus (MA), Santarém e Belém/Barcarena (PA), Santana (AP) e São Luís (MA). O problema só não é maior, diz ele, porque aumentar a capacidade de exportação dos portos é mais fácil que otimizar o escoamento das zonas produtoras até lá. “Para o porto, se há demanda, o retorno é garantido e o investimento é muito mais fácil”, afirma o analista da Embrapa Gustavo Spadotti. Em São Luís, onde desemboca o corredor ferroviário de 1.300 km operado pela VLI, a companhia tem duas opreações, o TPSL (Terminal Portuário São Luís), na área privada da Vale, e um berço (área em que o navio atraca) na área pública do Tegram. O sistema precisa ficar todo conectado para que possa aproveitar imediatamente novas oportunidades de demanda, diz o diretor de novos negócios, Fabiano Lorenzi. RECORDES Em 2016, foram 3 milhões de toneladas de grãos embarcadas. Neste ano, antes do final da safra, a ferrovia já despejou em Itaqui 3,8 milhões de toneladas de soja e 550 mil toneladas de milho, cuja safra está só começando. A VLI, formada em 2014 por Vale (37,6%); Brookfield Asset Management (26,5%); Mitsui (20%) e Fundo de Investimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS (15,9%), consegue embarcar em seus terminais entre 4,5 milhões e 5 milhões toneladas de grãos por mês -o equivalente a 16 navios cheios. No Tegram como um todo, o embarque de grãos já bateu 5 milhões de toneladas em junho, relata Ted Lago, presidente da Emap, empresa pública maranhense que administra o porto de Itaqui. O ano deve fechar com recorde de 7 milhões e a capacidade do terminal deve dobrar para 14 milhões de toneladas em 2019, quando estiver concluída a fase 2. Em 2021, um novo acesso ferroviário deverá receber 20 milhões de toneladas, com novos terminais para celulose, fertilizantes e para o embarque de contêineres. DO PORTO PARA DENTRO O movimento acontece também de fora para dentro do país. De São Luís as mesmas ferrovias e estradas que trazem soja levam combustível para sete Estados do Nordeste e do Centro Oeste. Os planos são aproveitar as rotas de volta com fertilizantes, impulsionados pela expansão da área plantada. Os balanços da Emap registram lucros anuais de R$ 43 milhões em 2016. Neste ano, no acumulado até agosto, a margem Ebitda (lucro antes de juros, impostos, depreciação e amortização) foi 43%, um dado que mostra alta capacidade de investimento com recursos próprios. A estratégia da empresa pública é aproveitar os recursos trazidos pela exportação de grãos para sofisticar a cadeia de produção de alimentos no Maranhão, atraindo frigoríficos, abatedouros e indústrias de alimentos. Segundo Ted Lago, o objetivo é desenvolver o Estado como grande produtor de proteína. “Se fôssemos olhar só para o retorno do acionista, provavelmente não investiríamos em um terminal refrigerado para contêineres. Mas para uma empresa pública isso faz sentido.” O fluxo de milho e soja (que alimentam os animais) e a estrutura do porto já atraíram para o Estado produtores de frango, suínos e lácteos, como os grupos Piracanjuba, Frango Americano, Notaro (Frango Natto), Ceará Alimentos e Agronor. FRANGO, LEITE E CAMARÃO O próximo passo será a produção de camarão, segundo o secretário de Agricultura, Márcio Honaiser. O Estado, que tem 70% de sua costa propícia à criação do crustáceo, vai receber um projeto do grupo Bomar que usa menos animais por área, o que leva a menos doenças, custo mais baixo e produtos mais competitivos. Segundo Honaiser, o porto de Itaqui deve começar a exportar carne processada vindo de Goiás e Tocantins, o que pode servir de estímulo para a bovinocultura e a indústria de carne também em território maranhense. O Estado tem o segundo rebanho nordestino, mas os bois são apenas criados no Maranhão e depois enviados para o Pará para a engorda. A meta é verticalizar: criar, engordar, abater e industrializar. E exportar por Itaqui. Mais difícil deve ser desenvolver a cadeia de fruticultura, um dos calcanhares de Aquiles do Maranhão. Na visita a São Luís, a Folha ouviu de uma dezena de pessoas, de taxistas a executivos, a frustração com o fato de que o Estado “importa” vegetais de vizinhos muito mais secos, como o Rio Grande no Norte. Regularização fundiária e recuperação da infraestrutura, porém, ainda devem atrasar o dia em que o Maranhão vai colher as próprias frutas que plantar, segundo o secretário da Agricultura. Mas o presidente da Emap já faz cálculos para esse dia. “A carga mais valiosa que embarca em Itaqui hoje o cobre: a tonelada custa US$ 4.700. Sabe quanto custa uma tonelada de castanha de caju? US$ 5.000”, diz Ted Lago, imaginando o dia em que embarcará contêineres do produto.