Janela de oportunidade se fechou

Depois de numerosas tentativas frustradas ao longo dos últimos anos, fica evidente que governos da região não possuem a capacidade de ajudar a Venezuela a sair do fundo do poço. Há três razões pelas quais um esforço regional liderado pelo Brasil é implausível. Primeiro, resta muito menos da democracia venezuelana hoje do que se via em 2003, quando o grupo “Amigos da Venezuela”, capitaneado pelo Brasil, foi crucial para restabelecer o diálogo entre o governo e a oposição. Enquanto a distribuição de forças entre o governo de Hugo Chávez (1954-2013) e a oposição estava relativamente equilibrada à época, criando um incentivo para o diálogo, hoje o governo Maduro e as Forças Armadas concentram quase todo o poder. Agora, a Venezuela é uma mistura de ditadura civil-militar e Estado falido, com vários oposicionistas presos ou exilados. O que resta da oposição deixou de ter um papel relevante na política venezuelana. A maior ameaça a Maduro não vem da oposição, mas do próprio chavismo. Portanto, os incentivos para ele negociar uma saída são baixos. Maduro sabe que, ao aceitar a promoção de eleições livres -condição inegociável para a oposição-, uma possível derrota nas urnas levaria a maior parte dos líderes políticos e militares do chavismo à prisão por envolvimento com tráfico de drogas, corrupção ou abusos de direitos humanos. Em segundo lugar, o governo brasileiro está consumido por uma crise interna da qual dificilmente sairá antes das eleições em 2018, dificultando a articulação de uma estratégia regional. Mesmo um governo brasileiro mais estável teria dificuldades de estabelecer um diálogo com o ator mais importante na Venezuela de hoje: as Forças Armadas, cuja aprovação é necessária para que Maduro tome qualquer decisão. Sem uma diplomacia paralela sofisticada entre as Forças Armadas brasileiras e venezuelanas, não há como promover um diálogo real. Por fim, qualquer tentativa de o Brasil liderar um esforço regional seria pouco viável pelo fato de nenhum dos quatro atores mais influentes na Venezuela hoje -Cuba, EUA, Rússia e China- integrar a América do Sul. O ator mais poderoso na Venezuela é Pequim, que se tornou o maior investidor e credor do país. Com empréstimos de mais de US$ 65 bilhões a Caracas desde 2005, a China é um ator político que não se pode mais deixar fora da equação. O segundo ator-chave é Washington, que continua comprando em torno de 700 mil barris de petróleo por dia. Contudo, em razão das sanções econômicas, o país vem perdendo espaço, e o governo venezuelano já articulou um plano B caso Donald Trump opte por um embargo econômico: compensar as perdas vendendo mais petróleo à China e à Índia. O terceiro ator mais influente é a Rússia, cujos investimentos em blocos de petróleo salvaram a Venezuela do colapso no ano passado. Há sinais de que Moscou está disposta a investir alto para dar sobrevida ao regime de Maduro. A parceria com Caracas é importante por várias razões. Entre 2012 e 2015, a Venezuela tornou-se o segundo maior comprador de armas russas. O regime também apoia os russos em fóruns multilaterais, quando Moscou continua sofrendo de isolamento. Cuba, por fim, ainda presta ajuda incalculável no nível multilateral, evitando o isolamento diplomático e assessorando Maduro em questões internas. Qualquer tentativa de melhorar a situação na Venezuela -seja pelo diálogo ou pressionando Caracas a aceitar ajuda humanitária- requer que China, EUA, Rússia e Cuba sentem à mesa. Na melhor das hipóteses, seremos coadjuvantes. OLIVER STUENKEL, 35, é professor de Relações Internacionais da Fundação Getulio Vargas (FGV), em São Paulo PARTICIPAÇÃO Para colaborar, basta enviar e-mail para [email protected] Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do jornal. Sua publicação obedece ao propósito de estimular o debate dos problemas brasileiros e mundiais e de refletir as diversas tendências do pensamentos contemporâneo.