‘Batalha dos Sexos’ reacende polêmica sobre igualdade de gênero no tênis

“Se ela jogasse o circuito masculino, seria mais ou menos a número 700 do mundo”, afirmou o ex-tenista John McEnroe sobre Serena Williams, em junho. “Se eu fosse uma jogadora, ficaria de joelhos todas as noites para agradecer a Deus por Federer e Nadal terem nascido. Eles têm carregado esse esporte”, disse Raymond Moore, diretor do torneio de Indian Wells no ano passado. Quando Billie Jean King, então com 29 anos, venceu o ex-tenista número um do mundo Bobby Riggs, 55, por 6/4, 6/3 e 6/3, na partida conhecida como “batalha dos sexos”, em 1973, a mobilização pela igualdade de gênero no tênis era crescente. Naquele ano foi criada a WTA (Associação do Tênis Feminino), e o Aberto dos EUA tornou-se o primeiro Grand Slam a igualar a premiação para homens e mulheres. Após 44 anos, completados nesta quarta-feira (20), as frases de figuras influentes do tênis mundial mostram que a batalha não acabou. Por ocasião do filme “Batalha dos Sexos”, que relembra a icônica partida, o tema voltou a ganhar destaque no circuito. O longa-metragem dos diretores Jonathan Dayton e Valerie Faris -os mesmos de “Pequena Miss Sunshine”- estreia nesta sexta-feira (22) nos EUA e em 19 de outubro no Brasil. Nele, Emma Stone (vencedora do Oscar de melhor atriz por “La La Land”) faz o papel de King. Riggs é interpretado por Steve Carell. Trailer Desde 2007, os quatro Grand Slams distribuem prêmios iguais nas chaves masculina e feminina -o último a aderir foi Wimbledon, após anos de pressão liderada principalmente por Venus Williams. Mas eles são exceções. A maioria dos torneios não é misto, e os dos homens costumam pagar mais. Em sua carreira, Serena Williams, 36, acumula US$ 84 milhões em premiação. Novak Djokovic, 30, e Roger Federer, 36, já passaram dos US$ 100 milhões. A americana, porém, tem o mesmo número de vitórias que o sérvio (783) e quase o dobro de títulos em Slams (23 contra 12). Dos dez tenistas mais bem remunerados, sete são homens. Além de Serena, Venus e Maria Sharapova são as únicas mulheres na lista. Mesmo assim, a desigualdade que persiste no tênis não se compara à de outros esportes. A seleção feminina dos EUA que venceu a Copa do Mundo de futebol em 2015 recebeu US$ 2 milhões pelo título, e os alemães, campeões em 2014, US$ 35 milhões. Entre os jogadores que já defenderam abertamente os montantes mais generosos para si, o de maior destaque é Novak Djokovic. Após a declaração de Moore em Indian Wells, ele disse que há mais interesse dos espectadores pelo jogos entre homens. Em julho, 57% das partidas de simples realizadas na quadra central de Wimbledon foram disputadas por eles. O que mais desagradou às tenistas foi a programação da “Manic Monday”, dia em que ocorrem todas as oitavas de final: elas protagonizaram dois dos seis jogos marcados para as quadras principais. “É um reflexo do estado em que nos encontramos, com a era dourada do tênis masculino”, disse o diretor executivo do torneio, Richard Lewis. Hannah Wilks, do jornal britânico “The Guardian”, descreveu o que considera um círculo vicioso dos organizadores: “Dê aos homens mais faturamento, estruture o evento para que o torneio deles seja tratado como o espetáculo principal e o das mulheres, como o secundário, e depois se surpreenda quando o fã casual de tênis estiver mais familiarizado com o jogo masculino”. O tênis é um dos esportes com mais convivência entre os gêneros. Meninos e meninas treinam juntos na infância e na adolescência. Em Grand Slams e na Olimpíada há torneios de duplas mistas. Ainda assim, a tenista brasileira Bia Haddad, 21, relata que comentários machistas persistem no circuito. “Por muitos meninos, eu tenho certeza de que não existiria o tênis feminino. Tem que compartilhar bola, quadra, dinheiro, público. Até de alguns treinadores já ouvi que eles não fazem questão nenhuma”, afirma à Folha. Gisele Miró, que jogou nos anos 1980, diz que não foi alvo de preconceito, mas recorda uma passagem significativa: “Tinha um [homem] que sempre perdia para mim, mas no vestiário masculino se gabava dizendo ter vencido”. Jogador mais ativo na defesa da igualdade, o britânico Andy Murray declarou em agosto à revista “Elle” não entender por que colegas não se orgulham de o tênis ser o “único esporte” onde aspectos como premiação e jogo são ao menos comparáveis. Apesar das dificuldades, Teliana Pereira, 29, e Bia, as duas melhores tenistas do Brasil nas últimas décadas, apostam em uma mudança cultural do público. “Ainda somos pouco reconhecidas, mas estamos tendo resultados melhores e aparecendo mais”, diz Teliana. Para Bia, que vive a melhor fase da carreira, sua geração cresceu sem uma referência feminina -a maior parte dos sete títulos de Grand Slam de Maria Esther Bueno datam dos anos 1960. Por esse motivo, ela almeja não apenas troféus, mas um legado. “A gente tinha como parâmetro os caras. Parece que é meio impossível a mulher no tênis. Poder contribuir para as meninas é um sonho que eu tenho”, afirma. BATALHA DOS SEXOS (Battle of the sexes) Direção Jonathan Dayton e Valerie Faris Elenco Emma Stone, Steve Carell Produção EUA, 2017 Quando estreia em 19 de outubro