Autor de pôster da Mostra de SP, Ai Weiwei exibirá filme sobre refugiados

Foi até involuntário, mas o resultado soou oportuno. O pôster da próxima Mostra Internacional de Cinema de São Paulo traz a imagem de duas mãos que se cumprimentam. Foi ideia do artista e ativista chinês Ai Weiwei, convidado para criar a imagem do cartaz deste ano, e que casa com a proposta curatorial de Renata de Almeida, diretora do evento. A 41ª edição do festival paulistano de cinema acontece entre 19/10 e 1°/11. “Na imagem parece que alguém está tentando socorrer outro”, diz Renata. “É simbólico que, nesse mundo louco de ódio e pouco diálogo, o cartaz proponha estender mãos.” Esse mundo louco estará refletido nos cerca de 300 títulos que a Mostra de SP pretende exibir na capital paulista. O ódio, por exemplo, vem sob a forma do contundente “Três Anúncios para um Crime”, de Martin McDonagh. Parábola sobre o ressentimento americano, o filme acaba de vencer o prêmio de público no Festival de Toronto e já é carta certa no Oscar. “O filme nos leva a entender de maneira menos preconceituosa pessoas como os eleitores de Trump”, afirma a diretora da Mostra de SP. A crise dos refugiados dá as caras, mas em tons que por vezes fogem do lugar-comum com que o noticiário se acostumou a encará-la. É vislumbrada, por exemplo, sob chave cômica (e nem por isso menos terna) em “O Outro Lado da Esperança”, do finlandês Aki Kaurismäki. Nele, o imigrante sírio Khaled encontra abrigo num restaurante capenga de Helsinque. Autor do pôster, Weiwei também aponta a sua câmera para aspectos inusitados do tema em seu “Human Flow”. No longa, que competiu no Festival de Veneza, o chinês percorre 23 países e revela situações como a das palestinas que se encontram em escombros lúgubres, “o único lugar para escapar da prisão que é Gaza”, afirmam. ARTES PLÁSTICAS A presença do artista Weiwei, aliás, aponta para outro eixo marcante da próxima edição da Mostra: a intersecção com as artes plásticas. “A linguagem não está mais compartimentada”, diz Renata. “Assim como cineastas fazem instalações, os artistas plásticos também estão fazendo seus próprios filmes.” “Visages Villages” é a união dos dois universos, trazendo a diretora belga Agnès Varda e o muralista francês JR viajando no interior da França. Já “Loving Vincent”, de Dorota Kobiela e Hugh Welchman, reconta a vida e a morte de Van Gogh usando pinturas a óleo aplicadas sobre os frames do filme. É, por sinal, o primeiro longa inteiramente realizado com essa técnica. O mundo das artes é pano de fundo para o mordaz “The Square”, do sueco Ruben Östlund, filme que ganhou a Palma de Ouro, prêmio máximo no último Festival de Cannes. Tradicional evento da Mostra, a exibição de cinema ao ar livre no parque Ibirapuera neste ano contará com a projeção de “O Homem Mosca”, de 1923, filme mudo de Fred C. Newmeyer e Sam Taylor. O longa é mais conhecido por sua famosa imagem de Harold Lloyd pendurado no ponteiro de um relógio de arranha-céu, símbolo da vertigem das novas metrópoles. O número de filmes programados nesta 41ª Mostra é parecido ao das últimas edições -bem abaixo dos 500 títulos que o festival paulista já teve. “É o tamanho ideal para a cidade”, diz Renata. “São menos filmes, mas não diminuímos o número de sessões.” O país homenageado será a Suíça, com uma retrospectiva da obra do diretor Alain Tanner (de “Jonas Que Terá Vinte e Cinco Anos no Ano 2000”) e de filmes da produção contemporânea do país. Dos títulos atuais, o destaque é “Mulheres Divinas”, de Petra Volpe, com que os suíços tentam uma vaga no Oscar. * OUTROS DESTAQUES ‘Happy End’ Conhecido por filmes com toques perversos, o austríaco Michael Haneke volta aos temas da velhice e da morte, já tratados em ‘Amor’, seu filme anterior. Aqui, ele aborda a história de uma rica família francesa cujo patriarca (Jean-Louis Trintignant) ensaia o suicídio ‘Três Anúncios para um Crime’ Para se vingar da polícia, incapaz de solucionar o assassinato de sua filha, Mildred (Frances McDormand) passa a intimidar o xerife local com mensagens em outdoors. Foi o vencedor do prêmio do público no Festival de Toronto ‘Radiance’ Em longa que concorreu à Palma de Ouro em Cannes, a diretora japonesa Naomi Kawase trata do tema da cegueira, sob o ponto de vista de um premiado fotógrafo que está perdendo a visão, e de seu envolvimento com uma tradutora de filmes para deficientes visuais ‘Felicité’ Vencedor do Grande Prêmio do Júri no último Festival de Berlim, o longa de Alain Gomis retrata as agruras da personagem-título, uma mãe congolesa que vaga pelas paupérrimas ruas de Kinshasa para ajudar o filho, que sofreu um acidente de motocicleta ‘Custody’ Em sua incursão atrás das câmeras, o ator francês Xavier Legrand levou o prêmio de melhor diretor em Veneza por sua trama sobre um casal divorciado (Denis Ménochet e Léa Drucker) que entra em pé de guerra pela custódia do filho, vivido por Thomas Gioria ‘Scary Mother’ Vencedor do prêmio de melhor filme no Festival de Locarno, o filme da diretora georgiana Ana Urushadze conta a história de uma dona de casa de meia-idade que abdica da própria família e chega à beira da insanidade ao se dedicar à verdadeira paixão, a escrita * IMS e Marabá A próxima edição da Mostra de Cinema de São Paulo ganhará reforço no número de salas de cinema participantes. Além dos tradicionais espaços que anualmente exibem a programação, como o Itaú e o circuito Spcine, também participarão neste ano o Cine Marabá, sala de rua na região central, e a nova sede do Instituto Moreira Salles, na av. Paulista, inaugurada nesta semana.