Brasileira relata escalada do medo no Líbano: ‘Uma de minhas alunas diz que já perdeu 20 conhecidos’

Pedagoga em Beirute, Natalie contou que seus alunos estão abandonando os estudos em decorrência da guerra. — Foto: Arquivo Pessoal

Pedagoga em Beirute, Natalie contou que seus alunos estão abandonando os estudos em decorrência da guerra. — Foto: Arquivo Pessoal

A carioca Natalie Nassif, de 38 anos e filha de pais libaneses, é professora em Beirute. Moradora do Líbano desde 2014 entre idas e vindas, a pedagoga contou ao g1 os desafios vividos por ela, alunos e parentes durante este conflito entre o país e Israel.

Natalie afirma que possui laços com o país e que voltará ao Brasil caso seja inevitável. Diz que os voos comerciais estão lotados e encontra muita dificuldade em comprar uma passagem aérea.

“A gente está esperando o Itamaraty começar a repatriação. Mas nós somos muitos brasileiros aqui, então isso vai acontecer aos poucos.”

Em 2020, Natalie afirma que decidiu retornar ao Brasil motivada por dois fatores: o trauma da explosão no porto de Beirute, próximo de onde residia, e a crise econômica que assolava o Líbano desde 2019.

Ela também diz que esses eventos criaram um ambiente de instabilidade e sofrimento que a levaram a buscar segurança e refúgio em sua cidade natal, o Rio de Janeiro, juntamente com seu marido libanês.

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Em 2023, Natalie diz que sentia falta do Líbano e resolveu retornar ao país. A saudade e a busca pelo sentimento de pertencimento os levaram a retornar antes do início da guerra.

“Existe um senso de comunidade muito forte no Líbano que a gente não estava encontrando no Rio de Janeiro, apesar de ser minha cidade natal. Decidimos voltar em 2023, voltamos antes da guerra em Gaza começar. Desde que a guerra em Gaza começou, a situação está bastante tensa”, diz Nassif.

Natalie diz que mesmo estando relativamente distante das zonas de risco, sente ansiedade e medo constantes com os bombardeios.

“A minha casa fica em Beirute, embora não estejamos nas zonas de risco maior, a gente consegue ouvir. Os drones, os aviões, algumas explosões e é um terror psicológico.”

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Para Nassif, a comunidade brasileira no Líbano se une em meio a essa atmosfera de angústia. Ela diz que eles se conectam através de grupos de WhatsApp para compartilhar informações, oferecer e receber acolhimento emocional. Essa rede de apoio mútuo se torna um refúgio importante em meio à incerteza e medo gerados pela guerra.

“A comunidade brasileira está em contato a gente, tem grupo de WhatsApp no telefone. Estamos nos falando com muita frequência e estamos todos bastante assustados, principalmente”.

Em relação a sua vivência como pedagoga, Natalie descreve que o impacto psicológico é enorme.

“Já estou vendo alguns alunos desistindo de seus estudos por não terem saúde mental para continuar. Uma das minhas alunas relatou que já perdeu 20 conhecidos nessa guerra e pessoas que trabalham comigo também já perderam suas casas, seus pertences e familiares. É claro que essas histórias mexem muito com a gente, é de cortar o coração”, lamenta.

O dilema entre permanecer em um local que oferece um senso de comunidade, mas que se encontra em guerra, ou buscar segurança em outro lugar, mesmo que distante de seus afetos e projetos, demonstra a difícil decisão que muitos imigrantes enfrentam em situações semelhantes.

“A gente quer acreditar que dias de paz virão e que a gente terá um cessar-fogo. Porque nenhuma guerra é boa para ninguém, ninguém sai ganhando. São civis morrendo. Sofrimento para todos os lados e a gente só quer paz.”

De acordo com o Ministério da Saúde do Líbano, mais de 1 mil pessoas foram mortas e 6 mil ficaram feridas ao longo das últimas duas semanas. O governo afirmou ainda que 1 milhão de pessoas – praticamente um quinto da população do país – deixaram as casas onde viviam.