‘Decidi ser escrava das mulheres que sofrem’, diz cantora Oumou Sangaré

Para Oumou Sangaré, cantora e ativista malinesa, o sofrimento da mulher é universal. “Canto com todas as minhas forças e vejo mulheres chorando ao meu redor”, disse durante um encontro na Casa da Cultura de Paraty, no Rio de Janeiro, neste domingo (8). Herdeira da tradição musical de sua família –sua avó foi uma “grande estrela” do país africano–, ela conta que começou a cantar na rua para ajudar nas finanças de casa após o divórcio dos pais, que deixou seis filhos dependentes de sua mãe, também cantora. “Eu vi uma mulher que sofria para se defender sozinha e alimentar os filhos e às vezes isso era muito duro, tinha dias em que ela se retirava no quarto para chorar”, recorda. Ela conta que o desejo de fazer a mãe feliz a incentivou, inclusive, a abandonar os estudos para se dedicar à música. Ainda que seu canto fosse as dores da matriarca, Sangaré conta ter percebido que as mulheres que a ouviam também se viam decifradas nele. “Quando uma mulher dá à luz, ela está entre a vida e a morte, mas ela o faz para que o mundo engrandeça, por que esse mesmo mundo não pode encarar os problemas dela?”, questiona. “É por isso que decidi ser escrava de todas as mulheres que sofrem.” Sangaré, que se diz uma “muçulmana relax”, tornou-se uma notória ativista na luta pela igualdade de gêneros, batalhando contra a circuncisão feminina e o casamento e a poligamia compulsórios –sem contar seu trabalho com a ONU pela erradicação da fome em países africanos. Com o discurso de empoderamento pelo trabalho –”desenvolvam-se e sejam úteis para sua família e seu país”, ela repete com frequência–, resolveu dar o exemplo, criando uma rede hoteleira e uma concessionária de carros e plantando milho, cebola e laranja. Os aspectos que moldaram a história de Sangaré estão impressos nos títulos de seus álbuns. Além do que leva o seu nome, “Moussolou”, o de estreia, significa “mulher”; “Ko Sira”, “o casamento de hoje”; “Worotan”, “preço por uma noiva”; “Seya”, “alegria”; “Kounadia”, “a boa estrela”. TRADIÇÃO SONORA Foi o mais recente, “Mogoya” (as pessoas da atualidade), que a cantora apresentou em Paraty, neste sábado (7), como parte da programação do Mimo Festival –o evento, gratuito, reuniu cerca de 25 mil pessoas com suas atrações gratuitas durante o fim de semana. Com letras em bambara, um dos diversos idiomas de Mali, Sangaré se consagrou como ícone do wassoulou, estilo musical derivado do folclore de uma região homônima da África Ocidental. No repertório que trouxe para cá, ela mistura o ritmo com batidas eletrônicas e conta que a atualização tinha como intuito atingir novas gerações e público do mercado global. A cantora mostrou a potência de sua voz, amparada por uma banda parte africana e parte europeia que incluía um kamale ngoni –instrumento típico do wassoulou semelhante a um berimbau e moldado com uma cabaça– e uma dupla de backing vocals hipnotizantes.