Doação de esmola divide moradores de Ipanema

RIO DE JANEIRO – Um grupo de moradores de Ipanema, na zona sul do Rio, iniciou campanha nas redes sociais para impedir a doação de esmolas a pedintes que vivem nas ruas. Sugerem que os doadores sejam até constrangidos por meio de gritos. Estariam estimulando a migração de pessoas em situação de pobreza para um dos cartões postais da cidade. Esses desvalidos incomodam os moradores e afugentam os turistas. O caos social das grandes cidades desumanizou os pedintes. Não são reconhecidos como cidadãos. Prevalecem a desconfiança e o medo. O Rio tinha 15 mil pessoas morando nas ruas no ano passado, de acordo com a Secretaria de Assistência Social. Cálculos preliminares indicam aumento de mais de um terço dessa população até o fim de 2017. A economia em crise é responsável pela degradação na condição de vida. Pesquisa recente encontrou entre os moradores de rua quase cem pessoas com curso superior. Em tese, mão de obra qualificada. Um ex-gerente de recursos humanos, sexagenário, com formação universitária e fluente em inglês, viveu um ano em praça em frente ao aeroporto Santos Dumont, no centro. Camuflava os pertences, entre os quais um terno e um computador portátil, em meio às árvores. Dormia no banco de cimento frio. Do aeroporto aproveitava também o sinal wi-fi, que lhe permitia atualizar o perfil numa rede social. Sua história espraiou-se pelo mundo digital até conseguir oportunidade de emprego. No dizer do sociólogo polonês Zygmunt Bauman, o mundo globalizado se divide entre os turistas e os vagabundos. Os primeiros escolhem os espaços em que vivem por prazer; os últimos encolhem-se em zonas segregadas do mundo que os refugou. Dar ou não esmola é assim resposta insuficiente para a questão de fundo. Um país justo se faz com políticas públicas inclusivas, não com algumas moedas.