Justiça aperta o cerco e pune candidatas laranja como fraude

Ainda que insuficientes, as cotas de candidaturas vêm se consolidando a cada eleição, inclusive ensejando punição pela Justiça Eleitoral em caso de descumprimento. Segundo Luiz Carlos dos Santos Gonçalves, procurador regional eleitoral de São Paulo, os partidos ignoravam as cotas num primeiro momento, e a Justiça dava prazo para que se corrigissem. “Atualmente, se a coligação não atende a cota no momento do registro, todos os candidatos são recusados.” Uma mudança na redação da lei em 2009 —de “deverá reservar” para “preencherá” um mínimo de 30% para candidaturas de cada sexo— tornou as cotas instauradas em 1997 efetivamente obrigatórias, mas gerou o efeito colateral das candidaturas “laranjas” ou “fantasmas”. Para cumprir a regra, passaram a inscrever mulheres candidatas sem que houvesse de fato campanha ou financiamento. Com isso, a porcentagem de mulheres entre os candidatos com zero voto saltou de 44,66%, em 2008, para 86,28% em 2012. Essa tática também já está na mira da Justiça. Uma decisão do TSE (Tribunal Superior Eleitoral) sobre as eleições de 2014 no Piauí abriu espaço para a investigação de candidaturas laranjas e seu enquadramento como fraude. Em agosto, pela primeira vez, vereadores foram cassados em Santa Rosa do Viterbo (SP) por candidaturas femininas fraudulentas em 2016. A decisão do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo tornou os responsáveis pela fraude inelegíveis. “O Judiciário entendeu que configurar as candidaturas fictícias como fraude seria a única maneira de efetivar as candidaturas femininas. O uso de laranjas, sendo fraude, derruba toda a coligação”, diz Karina Kufa, professora do Instituto de Direito Público de São Paulo e advogada eleitoral. Há na Procuradoria Regional Eleitoral de São Paulo (PRE-SP) mais de 230 procedimentos para investigar candidaturas fictícias de mulheres. O órgão entrou com sete ações por fraude no cumprimento da cota na eleição de vereadores na cidade de São Paulo. A investigação ouviu mais de cem mulheres e algumas nem sequer sabiam que eram candidatas. As ações pedem a inelegibilidade e a cassação de vereadores eleitos em coligações que tenham descumprido a regra. Todas foram julgadas improcedentes pela Justiça em primeiro grau. A Procuradoria recorreu. REGRAS EM VÃO Outras regras que deveriam impulsionar a representação feminina também têm sido alvo de disputa. A legislação eleitoral determina que os partidos devem reservar 20% do tempo de propaganda na TV e no rádio para “promover e difundir a participação da mulher na política”. De 2012 até julho de 2017, houve 60 representações da PRE-SP contra 24 partidos por descumprimento. A lei diz ainda que um mínimo de 5% da verba do fundo partidário destinada a financiar campanhas deve ser usada para candidatas. A reforma eleitoral de 2015, no entanto, estabeleceu um teto de 15% que, para os especialistas, é inconstitucional. Há uma ação no Supremo Tribunal Federal que questiona isso. “É uma situação muito esquisita porque a lei diz que tem que ter 30% de candidaturas femininas, mas só pode usar 15% dos recursos públicos”, diz Gonçalves. “Deveria haver a correção de todas essas distorções, mas temos um Congresso Nacional dominado por homens que não têm interesse na participação das mulheres. Aprovar isso vai custar muito, por isso precisamos de mais mulheres eleitas e aí caímos num círculo vicioso”, afirma a vereadora de Belo Horizonte Áurea Carolina (PSOL). As barreiras enfrentadas por mulheres – MAIS MULHERES Sugestões de especialistas e ativistas para aumentar a participação e a representação femininas na política Dentro dos partidos Fundo partidário Regras eleitorais Propaganda eleitoral Poder Legislativo Poder Executivo Educação Veja o vídeo