Luz da Oca não faz justiça ao trabalho do ‘filósofo’ Storaro
ESCREVENDO COM A LUZ (bom) * Alguém que nunca tenha lido ou nem mesmo pensado detidamente sobre o papel da direção de fotografia no cinema terá uma excelente introdução ao tema com a exposição “Storaro: Escrever com a Luz. Dupla Impressão entre Fotografia e Cinematografia”. Direção de fotografia? Com o italiano Vittorio Storaro, o mais adequado é falar em “cinematografia” (escrever com a luz). Já houve diversos mestres nesse ofício, mas nenhum em atividade tem carreira que se iguale à dele. Exposta na Oca, a seleção de pinturas que usou como referência –ao lado de imagens de filmes que resultaram dessas pesquisas– investe contra a ideia popular de “gênio”, ou do talento excepcional que se impõe sem esforço. O nome do meio de Storaro é trabalho. Platão, Aristóteles e Sócrates, bem como filósofos modernos, estão entre os autores que ele diz terem sido importantes em sua formação como artista. Logo depois de seu primeiro trabalho como assistente de câmera, ele afirma ter estudado fotografia durante cinco anos e cinematografia por mais quatro antes de assumir, em 1968, seu primeiro desafio como cinematógrafo (“Giovinezza, Giovinezza”, de Franco Rossi). “O tipo específico de movimento da câmera deve estar conectado com a literatura da história”, disse em uma entrevista, em 2015. Na ocasião, depois de fazer 59 longas em película, ele iniciava seu primeiro trabalho inteiramente em suporte digital (“Café Society”, de Woody Allen). “O ritmo da câmera e da iluminação deve estar relacionado à música. A composição das imagens deve ser influenciada por um conhecimento de pintura.” Admirador de filósofos, Vittorio Storaro veio a se tornar uma espécie de filósofo da cinematografia, como demonstram os seus textos distribuídos pela exposição, breves tratados sobre conceitos e práticas. Mas… em casa de ferreiro, espeto de pau. O primeiro andar da Oca, com suas janelas circulares permitindo generosa entrada de luz exterior, está longe de ser o espaço mais indicado para uma exposição como essa. É preciso, por exemplo, lutar contra os reflexos de luz sobre as imagens, algumas das quais já não foram reproduzidas com a qualidade necessária para fazer justiça ao trabalho de Storaro e dos pintores ali reunidos, como o italiano Caravaggio. Encare como parte da aula: enquanto desfruta o passeio pela ideia de escrita da luz no cinema, tal como Storaro a compreende, repare também que tudo o que está reunido na Oca teria ficado mais forte, expressivo e belo em um local com… desenho de luz.