Manifesto quer pacto com agronegócio para salvar cerrado
O desmatamento causado pela expansão do agronegócio coloca em risco o chamado berço das águas do Brasil. O cerrado, que abriga nascentes de oito das 12 regiões hidrográficas do país, como as do Amazonas/Tocantins, São Francisco e Prata, e os aquíferos do Guarani, Bambuí e Urucuia, já perdeu cerca de 50% de sua área original. Estudos apontam que os rios tiveram sua vazão diminuída após a conversão de áreas nativas em lavouras e pastagens. As taxas de desmatamento do bioma têm superado as da Amazônia nos últimos dez anos e que esse ritmo de destruição torna a região um dos ecossistemas mais ameaçados do planeta. Esses dados fazem parte do inventário de pesquisas reunido por mais de 40 organizações ambientais, entre elas Greenpeace, Instituto Socioambiental (ISA), WWF-Brasil e Observatório do Clima, e que servem de base para o Manifesto do Cerrado, lançado na última segunda, 11 de setembro. Entre 2013 e 2015, foram perdidos 18.962 km² e, a cada dois meses, é devastada área como a da cidade de São Paulo. O manifesto alerta para as alterações no regime de chuvas na região “impactando a produtividade da própria atividade agropecuária, como já ocorre na Amazônia” . Também mostra que, entre 2007 e 2014, 26% da expansão agrícola ocorreu sobre a vegetação de cerrado. Se considerada a região chamada de Matopiba (que inclui partes do Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), 62% da expansão agrícola ocorreu sobre vegetação nativa e o desmatamento de 6,6 milhões de hectares aponta para altos riscos de desertificação. Um outro ponto destacado é que as emissões de gases de efeito estufa decorrentes do processo impedirão o Brasil de cumprir compromissos internacionais nas Convenções do Clima e de Biodiversidade. As organizações dirigem apelo às empresas que compram soja e carne do cerrado e aos investidores do setor, em busca de um compromisso de todas as cadeias de produção e consumo que impactam o bioma. Defendem que a expansão agropecuária não pode seguir por meio da destruição de ecossistemas naturais. Segundo dados reunidos no manifesto, é possível expandir a fronteira agrícola sobre áreas degradadas, garantindo o aumento da produção e o desenvolvimento social e econômico que a região precisa. Seriam 40 milhões de hectares já desmatados e com potencial para plantio da soja no Brasil, o suficiente para atender às metas brasileiras de expansão dos próximos 50 anos. Em artigo sobre o manifesto, o coordenador do Programa Cerrado Pantanal do WWF, Julio César Sampaio, afirma que é necessário “estabelecer um pacto pelo desmatamento zero no bioma”. “Está na hora de assumir que a agropecuária só pode se expandir em pastos degradados e não em ecossistemas naturais”. LEIS E MONITORAMENTO As entidades defendem que é urgente aprovar um marco legal de proteção do bioma, através da da PEC 504/2010, que inclui na Constituição o cerrado e a caatinga como patrimônios nacionais, e do PL 25/2015, que dispõe sobre a conservação e a utilização sustentável da vegetação nativa do bioma. Mas há dois perigos à vista, que podem acelerar ainda mais o desmatamento. Um deles é a aprovação da compra de terras por estrangeiros, aumentando a especulação na região (através de seis projetos de lei que correm anexos ao PL 2289/2007, em trâmite na Câmara). Outro é a aprovação de leis sobre o licenciamento da produção agropecuária, flexibilizando a regularização e facilitando o desmatamento (por meio de 19 Projetos de Lei apensados no PL 3729/2004). O manifesto propõe o estabelecimento de programas de monitoramento periódico do desmatamento, para ajudar na prevenção e na recuperação de áreas já desmatadas, e sua publicação regular.