Na Catalunha, política cria dilema entre independência ou vida normal
SÃO PAULO – Quer um exemplo de como os políticos são capazes de arrastar toda uma população para uma agenda que diz respeito a eles mesmos? Olhe para a Catalunha. Marcado para domingo, o plebiscito sobre a independência é daqueles eventos que interessam muito mais à classe dirigente do que às pessoas. Carreiras políticas inteiras foram construídas graças a essa questão, que tira o foco de escândalos e drena energia de problemas reais. Tem razão Felipe González, mais duradouro premiê espanhol após a redemocratização, que há alguns anos disse ser a independência um objetivo impossível, mas ainda assim capaz de causar dano por décadas. A tertúlia de séculos ganhou ares sombrios. O plebiscito é ilegal, decidiu a Justiça espanhola. Daí decorre que a polícia catalã foi instada a agir contra seu chefe, o governo local. A ilegalidade coloca a votação em patamar muito diferente das ocorridas na Escócia e em Québec. As pesquisas até aqui não apontam apoio maciço à separação. Até porque o sentido da história vai contra os pilares do catalanismo. A imigração deste século multiplicou por seis a população estrangeira, que totaliza 14% dos 7,5 milhões de habitantes. O espanhol é língua universal. O catalão, dominado por 60%, não seduziu nem o mais idolatrado habitante da área, Lionel Messi. Tampouco há algum drama malparado. Integrar a Espanha não impediu que Barcelona virasse o que virou: uma das maiores concentrações de pessoas interessantes, criativas e de bem com a vida do planeta. Uma metáfora usada na Catalunha diz que o independentismo funciona como um trem. Cada um dos políticos vai descendo na estação que mais lhe convém, após ganhar um pouco mais de autonomia ou dinheiro. Ao destino final, a independência, ninguém quer de fato chegar, porque faria secar o combustível que os move. Interesse público? Esse continua na plataforma de embarque.