Na França como aqui
Mais uma vez, franceses foram às ruas para protestar contra reformas de cunho liberalizante. Desta vez, os alvos são as mudanças na legislação trabalhista e o presidente do país, o centrista Emmanuel Macron, que as capitaneia. Dezenas de milhares se manifestaram em várias cidades, mas os protestos atraíram menos gente —e se mostraram menos violentos— do que aqueles registrados durante o ano passado, quando o então governo socialista tentava flexibilizar as leis do emprego. Há um razoável consenso entre economistas ao atribuir o mau desempenho do mercado de trabalho na França —cuja taxa de desocupação é o dobro das de vizinhos como Alemanha e Reino Unido— ao excesso de regulamentação. Com efeito, o Código do Trabalho francês faz inveja, em extensão e detalhismo, à já caudalosa CLT brasileira, cuja rigidez, ao menos até hoje, tem dificultado contratações e acordos entre empresas e funcionários. Não é por outro motivo que sucessivos governos franceses, de diferentes matizes, tentaram liberalizar a legislação, sempre esbarrando em alguma resistência popular. Assim, as mudanças têm vindo em diluições homeopáticas, insuficientes para produzir qualquer efeito terapêutico digno de nota. Pergunta-se, agora, se Macron poderá triunfar onde seus antecessores fracassaram. Apesar da maioria no Legislativo, o presidente decidiu fazer a reforma por decreto, sem passar por desgastantes debates parlamentares. Está em curso uma negociação com centrais sindicais, o que ajuda a explicar o relativo esvaziamento da jornada de protestos. Das principais, só a CGT, a mais radical, aderiu às manifestações. Macron também pode alegar que em nenhum momento enganou seu eleitor. Sempre deixou claro, durante a campanha em que saiu vitorioso e também nas eleições legislativas um mês depois, que enfrentaria as leis do trabalho. Nem tudo, porém, são pontos positivos. O líder francês sofre com o encolhimento de popularidade, atribuído pelo menos em parte à reforma. Eleito com 66% dos votos em maio, obteve uma maioria de 61% do Parlamento em junho, mas, em agosto, era aprovado por apenas 37% do eleitorado. Já não fosse um cenário político preocupante para Macron, seu desgaste tende a aumentar com planos de alterar a Previdência e as regras de auxílio-desemprego. A democracia produz conflitos quando a lógica econômica exige a revisão de direitos, ainda mais num país que venera o controle estatal. [email protected]