Presidente do Peru cancela ida a cúpula da ONU por crise no governo

O presidente do Peru, Pedro Pablo Kuczynski, deu posse no último domingo (18) a uma nova primeira-ministra e mais cinco ministros, depois que os titulares desses postos foram impedidos de continuar por conta da pressão da oposição fujimorista no Congresso. A crise política obrigou Kuczynski a cancelar sua viagem à Nova York, na qual participaria do encontro da ONU e de um encontro de presidentes latino-americanos com Donald Trump. Desde o início de seu mandato, em julho de 2016, o presidente peruano vem convivendo com dificuldades em ter medidas aprovadas pelo Parlamento, além de ser impedimento de indicar nomes para diferentes postos e ver processos de “impeachment” abertos contra seus ministros. O partido de Kuczynski (Peruanos Por el Kambio) tem apenas 18 cadeiras no Parlamento, enquanto a Força Popular, partido do fujimorismo, possui 71. A nova primeira-ministra (cargo equivalente ao de chefe de gabinete) é Mercedes Araóz, que participou da última gestão de Alan García (2006-2011) e é conhecida por ter habilidade para dialogar com distintos grupos políticos. Também assumiram no domingo os novos ministros de Educação, Justiça, Economia, Saúde e Habitação. Três deles são próximos ao fujimorismo. A mudança do primeiro-ministro foi necessária depois que o Congresso, na noite da última sexta-feira (15), retirou a confiança de Fernando Zavala (recurso previsto na Constituição), que havia sido escolhido por Kuczynski e exercia o cargo desde que este assumiu. Já os outros ministros foram sendo derrubados ao longo dos últimos meses, em processos de “impeachment” parlamentar, cada um por razões diferentes. O caso mais ruidoso foi o da saída da titular de Educação, Marilú Martens, que se deu porque os fujimoristas defendiam que ela promovia uma “ideologia de gênero”, com a distribuição de panfletos educativos que explicavam a diversidade sexual. Em dezembro, os fujimoristas já haviam afastado outro ministro da mesma pasta, Jaime Saavedra. Em seu lugar, assume um nome mais conservador, Idel Vexler, ex-integrante do gabinete do ex-presidente Alejandro Toledo, e um dos criadores da campanha “Com meus filhos não se meta”, que prega a retirada da discussão sobre gênero do currículo escolar. Martens, que não se conformou com a troca, tuitou no domingo que “como ministra defendi a igualdade de gêneros na educação e continuarei fazendo isso pelas mulheres que ainda sofrem violência”. O novo titular de Justiça, Enrique Mendoza, é um homem de confiança do fujimorismo, e a favor de que se conceda indulto ao ex-presidente Alberto Fujimori, hoje preso, condenado a 25 anos por crimes de direitos humanos e corrupção. O indulto a Fujimori, que é uma decisão que apenas o presidente pode tomar, tem sido um assunto de divisão no Peru desde os tempos do antecessor de Kuczynski, Ollanta Humala. Agora, porém, os fujimoristas se veem mais fortes para pressionar pela libertação de seu líder. Pesquisa recente mostra que 65% dos peruanos está a favor da libertação do ex-presidente por razões humanitárias –está com 79 anos e tem um câncer de garganta. Isso causaria, porém, uma rejeição alta entre o eleitorado do próprio Kuczynski, porque muitos dos que o escolheram declararam na época ter optado pelo “voto útil”, justamente para barrar a ascensão de Keiko Fujimori. Kuczynski acabou vencendo o pleito contra ela por apenas 50 mil votos. A nova ministra de Economia já era a vice-ministra da pasta. O fujimorismo pediu a saída do titular anterior, Alfredo Thorne, por considerar que a economia não vinha com um bom desempenho –a previsão de crescimento para este ano é de 3% do PIB. Kuczynski tem tentado, desde que a crise começou, em abril, estabelecer canais de diálogo com a oposição e chegou a receber a líder da Força Popular, Keiko Fujimori, no palácio presidencial. Mas a pressão contra o Executivo continuou. A Constituição do Peru permite que o presidente reverta a derrubada de ministros e até chame novas eleições se considerar que a governabilidade do país está em risco. Alguns de seus assessores vêm pedindo que considere essa opção, mas Kuczynski prefere não entrar em choque direto com a oposição, uma vez que sua popularidade também anda em baixa –22%, segundo pesquisa divulgada na semana passada. Em cadeia nacional, no sábado (16), Kuczynski disse que respeitaria a decisão do Congresso e que, por conta da crise política, cancelaria sua ida à reunião da ONU.