Visitas passam a ser barradas em cartões-postais de Brasília
Raimunda Ferreira Duarte veio com a família do Ceará para Brasília há 37 anos. Com um chapelão para enfrentar o sol inclemente nesta época do ano, é um dos cerca de 20 vendedores de souvenirs, canecas e estatuetas de um dos cartões-postais do país, a Praça dos Três Poderes. Os clientes preferenciais de Raimunda são os turistas que chegam ao Palácio do Planalto e ao STF (Supremo Tribunal Federal), do outro lado da praça. Ou melhor, chegavam. Nos últimos quatro meses, o trabalho de Raimunda sofreu duro golpe, segundo ela: as visitas aos dois prédios são agora cercadas por uma série de novos atos da burocracia. No Planalto, só com agendamento durante a semana, mas nem sempre o site permite uma vaga. No Supremo, agora é proibido visitar o prédio nos finais de semana. “Está ruim, e muito. As pessoas agora têm que marcar com antecedência, tem que isso, tem aquilo. Antes não tinha”, disse Raimunda. Quando o empresário Joesley Batista entrou no Palácio do Jaburu e conseguiu gravar o presidente Michel Temer em março passado não houve nenhuma objeção do sistema de segurança a cargo do GSI, o Gabinete do Segurança Institucional. Mas qualquer turista que resolva de última hora conhecer um dos prédios mais importantes da cidade será barrado. As medidas ferem uma tradição de anos em Brasília. Era parte do ritual dos brasilienses no fim de semana levar parentes e amigos de lugares distantes para conhecer os prédios por dentro. Grades colocadas na frente do Planalto após os protestos de rua no governo Dilma Rousseff, em 2013, afetam a fachada e impedem a livre circulação das pessoas. O mesmo ocorre no STF. Na frente do Planalto, elas interditam toda a calçada, empurrando cadeirantes, idosos e crianças para a rua. A procuradora da República Carolina de Oliveira recomendou em agosto que o Planalto, o STF e o Palácio do Buriti, sede do governo do DF, retirassem as grades em 30 dias. Somente o Buriti acolheu a recomendação. Na via de acesso a outro prédio, o Alvorada, foram instalados blocos de concreto e uma cancela no meio da rua. Não raro são vistos ali carros militares e soldados armados. Filha do urbanista e autor do projeto do Plano Piloto de Brasília, Lúcio Costa (1902-1998), a arquiteta Maria Elisa Costa chama o bloqueio de “ridículo” e considera as grades deformação paisagística. O bloqueio no acesso ao Alvorada foi determinado depois que um adolescente ao volante invadiu o prédio em junho. No portão da Câmara, no lugar de uma grade, chapas de ferro obstruem a visão. OUTRO LADO Em nota, o GSI diz que as medidas estão amparadas em decreto de 12 de abril deste ano. “Episódios recentes na Esplanada dos Ministérios e nas residências oficiais comprovam a necessidade de manutenção desta prescrição”. O Planalto afirmou que “atualmente o acesso é mais organizado e confortável para o visitante, que pode programar sua entrada com antecedência”. O Iphan afirmou em nota à Folha que considera as medidas “transitórias”. A Câmara disse que a decisão “de se cobrir com telha metálica os limites da residência oficial” da presidência da Casa foi “motivada por questões de privacidade”. O STF não se manifestou.